Morada Nova. O que no passado foi sinônimo de esperança, atualmente é um sistema obsoleto, morto pela seca e desassistido de iniciativas que possam ressuscitá-lo. O perímetro irrigado deste Município do Vale do Jaguaribe, distante 180Km de Fortaleza, amarga tempos de incerteza. A estrutura não tem nenhuma garantia de que possa ser novamente um amparo para milhares de agricultores e produtores da região. Sem água, a classe sofre e busca alternativas para superar aquele que é avaliado como um dos momentos mais difíceis dos seus 46 anos.
De um dos pontos mais altos da cidade, onde pode se ver todo o Perímetro, o verde-claro da forragem viva percebe-se em raras exceções, em meio ao dourado dos galhos secos. A maioria dos espaços do Perímetro é apenas um enorme pedaço de terra batida, sem nada mais para gerar de produção. Um período que José Moacir Lima, 51, irrigante e produtor, conta jamais ter visto em todo o tempo que passou trabalhando no local. "Em 2002, o açude secou, mas foram só seis meses, logo tomou recarga. Quer dizer, a gente não sentiu. Só que agora não, a situação está crítica e difícil. Ninguém nunca tinha visto isso", explica Moacir.
O pai foi um dos primeiros assentados. Com sua morte, o lote passou para ele, que há mais de 20 anos cuida do espaço herdado. Ele se junta a tantos outros que se dedicaram tanto às produções do Perímetro que não sabem fazer outra coisa. Mas arriscar a continuar investindo no lugar tem sido uma escolha perigosa. "A gente está atirando no escuro, porque de repente você sofre um colapso e perde tudo. Nós já temos irrigante que plantou e perdeu. E além de ter perdido vai ficar devendo porque, por sermos pequenos irrigantes, não temos suporte financeiro", diz.
Um levantamento feito pela Unidade de Campo do Baixo Jaguaribe do Departamento Nacional de Obras Contas as Secas (Dnocs) apontou que o arroz e a forragem são, hoje, as culturas predominantes entre os proprietários dos lotes do Perímetro. Mas, seja qual for a cultura, parece não haver saída: é plantar e morrer. Nem mesmo para o gado tem forragem se sustentando nas terras de Morada Nova. José Marckran Rubens Rabelo, 47, perdeu sete cabeças em sete meses. E teme perder mais. "A gente planta a forragem, não dá; cava o poço profundo, mas a água é tão salgada que o gado não bebe. Desistir não posso porque eu não tenho outra coisa para fazer". Marckran abaixa a cabeça e balança, sinalizando que não consegue mais falar.
Prejuízos
Morada Nova ainda é uma cidade movimentada. O comércio ferve e, apesar dos problemas relacionados a gestões passadas, o Município é, aparentemente, bem estruturado. Mas, o fim do período de produção no Perímetro parece ter imposto uma linha divisória na economia. Pelos relatos, percebe-se que havia uma Morada Nova antes, durante e depois do desuso do Perímetro.
"O número de irrigantes e produtores diminuiu consideravelmente. Hoje, quem faz ainda alguma coisa em seu lote, está lidando com uma queda de cerca de 80%. Está tudo parado", dispara Francisco Sales Almeida, presidente da Associação dos Usuários da Água do Distrito do Perímetro Morada Nova (Audipim). "Faz dois anos que não tem água no canal e em 2014 a gente só plantou, em média, 30%. Foi o último ano que deu alguma coisa".
Segundo os dados da Audipim, em 2005 o perímetro tinha mais de 2 mil irrigantes. Atualmente são 936. Na mesma época a área em uso do perímetro era de 10.849 hectares, hoje, são pouco menos do que 4.500 e com experiências que não têm dado certo, como a de Marckran. O que era plantado por semestre correspondia a cerca de 1.200 hectares. Nos dias de hoje esta não chega nem a 300 hectares de produção.
"Todo dia eu vejo relato de irrigante: 'hoje eu vendi minha vaca'; 'hoje eu vendi uma moto'. O que tinham, eles vendem para sobreviver e pagar dívidas no comércio. Essa é a saída até que Deus mande um bom inverno", conta o presidente da Audipim.
Problemas e fracasso
Em meio às tentativas que não dão certo, há irrigantes que não veem outra solução a não ser buscar oportunidades em outros lugares. "Nós tivemos irrigantes que foram para Minas Gerais e quando chegaram lá não encontraram emprego. Temos muitos que morreram sem ter o que fazer da vida", conta o presidente da Audipim.
A sucessão de fracassos põe a situação dos perímetros em análise. Parte da culpa foi mesmo da seca. Mas há quem diga que houve decisões que pesaram e transformaram o sonho em pesadelo, por exemplo, tirar a administração dos perímetros do Dnocs. É o que opina José Audísio Barreto Girão, chefe do escritório do Dnocs em Morada Nova. "Existia antes uma cooperativa central, que cuidava de toda a produção e comercialização. Tinha orientação técnica, escritórios de zona com agrônomo, técnico agrícola, veterinário e assistente social. Inventaram de emancipar os perímetros em 1984 e isso não deu certo. O Dnocs foi retirado do Perímetro com esta decisão e pronto".
Há ainda o problema envolvendo a estrutura dos perímetros que, desde 1970, conforme relatam os assentados, quando foram postos em atividade, não passaram por uma vistoria. A cultura também é outra, fator que, para Audísio, necessita ser revisto. "Quando o Perímetro voltar a produzir, há necessidade de mudança na cultura a ser plantada, além dos sistemas de irrigação. A transposição não traz nenhuma segurança para a irrigação, ela traz para o abastecimento humano, animais, para a indústria", completa.
A desesperança se completa com o número irrisório de assentados. Há hoje apenas quatro gerações de familiares daqueles assentados de 1º de julho de 1970. Mas Audísio Girão ainda vê uma chance. "Tem jeito sim. Reclamam que a estrutura está obsoleta, mas, se tiver água, no outro dia tem produção".
Fonte diário do nordeste
De um dos pontos mais altos da cidade, onde pode se ver todo o Perímetro, o verde-claro da forragem viva percebe-se em raras exceções, em meio ao dourado dos galhos secos. A maioria dos espaços do Perímetro é apenas um enorme pedaço de terra batida, sem nada mais para gerar de produção. Um período que José Moacir Lima, 51, irrigante e produtor, conta jamais ter visto em todo o tempo que passou trabalhando no local. "Em 2002, o açude secou, mas foram só seis meses, logo tomou recarga. Quer dizer, a gente não sentiu. Só que agora não, a situação está crítica e difícil. Ninguém nunca tinha visto isso", explica Moacir.
O pai foi um dos primeiros assentados. Com sua morte, o lote passou para ele, que há mais de 20 anos cuida do espaço herdado. Ele se junta a tantos outros que se dedicaram tanto às produções do Perímetro que não sabem fazer outra coisa. Mas arriscar a continuar investindo no lugar tem sido uma escolha perigosa. "A gente está atirando no escuro, porque de repente você sofre um colapso e perde tudo. Nós já temos irrigante que plantou e perdeu. E além de ter perdido vai ficar devendo porque, por sermos pequenos irrigantes, não temos suporte financeiro", diz.
Um levantamento feito pela Unidade de Campo do Baixo Jaguaribe do Departamento Nacional de Obras Contas as Secas (Dnocs) apontou que o arroz e a forragem são, hoje, as culturas predominantes entre os proprietários dos lotes do Perímetro. Mas, seja qual for a cultura, parece não haver saída: é plantar e morrer. Nem mesmo para o gado tem forragem se sustentando nas terras de Morada Nova. José Marckran Rubens Rabelo, 47, perdeu sete cabeças em sete meses. E teme perder mais. "A gente planta a forragem, não dá; cava o poço profundo, mas a água é tão salgada que o gado não bebe. Desistir não posso porque eu não tenho outra coisa para fazer". Marckran abaixa a cabeça e balança, sinalizando que não consegue mais falar.
Prejuízos
Morada Nova ainda é uma cidade movimentada. O comércio ferve e, apesar dos problemas relacionados a gestões passadas, o Município é, aparentemente, bem estruturado. Mas, o fim do período de produção no Perímetro parece ter imposto uma linha divisória na economia. Pelos relatos, percebe-se que havia uma Morada Nova antes, durante e depois do desuso do Perímetro.
"O número de irrigantes e produtores diminuiu consideravelmente. Hoje, quem faz ainda alguma coisa em seu lote, está lidando com uma queda de cerca de 80%. Está tudo parado", dispara Francisco Sales Almeida, presidente da Associação dos Usuários da Água do Distrito do Perímetro Morada Nova (Audipim). "Faz dois anos que não tem água no canal e em 2014 a gente só plantou, em média, 30%. Foi o último ano que deu alguma coisa".
Segundo os dados da Audipim, em 2005 o perímetro tinha mais de 2 mil irrigantes. Atualmente são 936. Na mesma época a área em uso do perímetro era de 10.849 hectares, hoje, são pouco menos do que 4.500 e com experiências que não têm dado certo, como a de Marckran. O que era plantado por semestre correspondia a cerca de 1.200 hectares. Nos dias de hoje esta não chega nem a 300 hectares de produção.
"Todo dia eu vejo relato de irrigante: 'hoje eu vendi minha vaca'; 'hoje eu vendi uma moto'. O que tinham, eles vendem para sobreviver e pagar dívidas no comércio. Essa é a saída até que Deus mande um bom inverno", conta o presidente da Audipim.
Problemas e fracasso
Em meio às tentativas que não dão certo, há irrigantes que não veem outra solução a não ser buscar oportunidades em outros lugares. "Nós tivemos irrigantes que foram para Minas Gerais e quando chegaram lá não encontraram emprego. Temos muitos que morreram sem ter o que fazer da vida", conta o presidente da Audipim.
A sucessão de fracassos põe a situação dos perímetros em análise. Parte da culpa foi mesmo da seca. Mas há quem diga que houve decisões que pesaram e transformaram o sonho em pesadelo, por exemplo, tirar a administração dos perímetros do Dnocs. É o que opina José Audísio Barreto Girão, chefe do escritório do Dnocs em Morada Nova. "Existia antes uma cooperativa central, que cuidava de toda a produção e comercialização. Tinha orientação técnica, escritórios de zona com agrônomo, técnico agrícola, veterinário e assistente social. Inventaram de emancipar os perímetros em 1984 e isso não deu certo. O Dnocs foi retirado do Perímetro com esta decisão e pronto".
Há ainda o problema envolvendo a estrutura dos perímetros que, desde 1970, conforme relatam os assentados, quando foram postos em atividade, não passaram por uma vistoria. A cultura também é outra, fator que, para Audísio, necessita ser revisto. "Quando o Perímetro voltar a produzir, há necessidade de mudança na cultura a ser plantada, além dos sistemas de irrigação. A transposição não traz nenhuma segurança para a irrigação, ela traz para o abastecimento humano, animais, para a indústria", completa.
A desesperança se completa com o número irrisório de assentados. Há hoje apenas quatro gerações de familiares daqueles assentados de 1º de julho de 1970. Mas Audísio Girão ainda vê uma chance. "Tem jeito sim. Reclamam que a estrutura está obsoleta, mas, se tiver água, no outro dia tem produção".
Fonte diário do nordeste