Principal atração da cidade de Quixadá, no Sertão Central do Ceará, o reservatório histórico está agonizando praticamente seco
Quixadá. A atual situação do centenário Cedro, o primeiro reservatório construído no Brasil, neste Município, distante cerca de 170Km de Fortaleza, deixa claro o aviso de seu fim. Segundo órgãos do Estado, o Cedro já é considerado seco e o mínimo de água inutilizável que ainda resta, deve evaporar dentro dos próximos dois meses. Como consequência, as espécies que viviam nas águas do açude também começam a morrer.
Construído durante o governo Imperial de Dom Pedro II, em seus tempos de glória, o açude viu até monomotor aquático aterrissar sobre suas águas. Hoje, a evaporação deu vista à terra seca e rachada. O enorme paredão que rodeia o açude já está completamente descoberto. Segundo dados da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh), até a última quinta-feira (20), o Açude do Cedro em Quixadá apresentava uma cota de pouco mais de 100 mil metros cúbicos acumulados. O valor é irrisório perante a capacidade máxima de 125.694.000 m³ que ele pode reservar. O que ainda resta nele, frente ao que pode suportar, representa apenas 0,20% de seu volume total.
Para a Cogerh, com a cota que atualmente tem, o açude já é considerado seco. Na última semana, uma onda de pânico se espalhou por Quixadá, com a possibilidade de que nos próximos dias a água restante se evapore por completo. De acordo com o presidente da Cogerh, João Lúcio Farias, pode ser que demore um pouco mais, mas o cenário não deve esperar mais do que dois meses para acontecer. "No ritmo que está indo, em função do processo de evaporação, ele deve secar. Eu não diria nos próximos dias, mas nesses meses, ele deve secar por completo", disse João Lúcio.
Tristeza histórica
A seca completa do Cedro é um fato tão raro que em mais de 100 anos só aconteceu quatro vezes: 1930, 1932, 1950 e 1999. A situação preocupa e ao mesmo tempo entristece a população de Quixadá. O aposentado João Soares de Freitas, 75, diz que jamais esperava rever o açude da maneira como está hoje. "Dá um desespero e, além disso, um desgosto para Quixadá porque ele é o cartão-postal da cidade, e ao ver o Cedro seco, a gente fica muito triste e desanimado". A última vez que João viu o Cedro como está foi há 12 anos. "Infelizmente é assim mesmo. Nunca seca dessa, a gente só pode mesmo é esperar pelo pior", diz.
Mesmo estando ciente do impacto causado pelo problema, o presidente da Cogerh tenta minimizar os efeitos, acrescentando que o açude já não abastece mais a cidade. "É um reservatório que hoje está com o uso muito mais para a manutenção da vida aquática local e para a parte histórica paisagística. A garantia do abastecimento está sendo feito pelo açude Pedra Branca", explicou.
O Pedra Branca abastece Quixadá e também Quixeramobim, por meio de uma adutora. Conforme os dados da Cogerh, sua cota atual equivale a 38% de sua capacidade total, a menor medição desde 2004. Ainda assim, João Lúcio assegura que o açude suporta a demanda. "Mesmo que não chova, nossas projeções são que esse reservatório atravesse o ano de 2017 abastecendo as duas cidades, até se aproximar o ano de 2018. Isso eu estou colocando numa condição de chuvas abaixo da média. Se tiver recarga, ele atravessa com mais facilidade ainda", afirmou.
Morte de espécies
O atual quadro do Açude do Cedro em Quixadá se agrava com o surgimento de espécies que apareceram mortas na vazante do açude. Na última semana dezenas de cágados apareceram mortos. O biólogo e professor do Departamento de Biologia da Universidade Federal do Ceará (UFC), José Roberto Feitosa, acredita que o processo de alimentação dos cágados foi afetado com a seca. "A situação pode ter interferido na cadeia alimentar desse bichos, ou pode ter sido alguma substancia na água, mas tem que ser feita uma análise da água e das condições em que eles estavam", explica.
Em uma das pesquisas que orientou nas águas do Açude Banabuiú, o professou viu um aluno constatar que os cágados são animais territorialistas. "Ou seja, eles vivem muito naquele lugar, não vão muito longe, por mais que a comida acabe, seja por qual razão for. Então, se ele ficar sem alimentação ali, morre porque não vai sair daquele lugar", enfatizou José Roberto.
Há cerca de três meses, dezenas de peixes também apareceram mortos nas águas da vazante do Cedro. O Biólogo explica que é preciso uma análise "mais cautelar", mas supõe que "Se o nível da água baixa com a evaporação, pode reduzir muito a capacidade de oxigenação e ocasionar uma dificuldade de respiração das espécies e, consequentemente, a mortandade".
Açudes secos
A situação do Cedro, em Quixadá, não é única. No Estado, segundo dados da Cogerh, 39 açudes estão em volume morto. Na medida em que forem secado ainda mais, eles passam ao nível de açudes secos. Atualmente 38 reservatórios encontram-se nesta situação no Ceará. Na última semana, o São José III, em Ipaporanga, endossou a lista.
Dos 153 açudes monitorados pelo órgão, 130 estão com volume abaixo de 30%. Os três maiores, Castanhão, Orós e Banabuiú, encontram-se com 5,95%, 19,41% e 0,53% acumulados.
por José Avelino Neto - Colaborador do DN