O destino de milhares de pessoas nesta semana é Porto Alegre — simpatizantes do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vão à cidade acompanhar seu julgamento, que ocorre na próxima quarta-feira (24). Lula terá seu recurso de apelação julgado em segunda instância, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ele já foi condenado pelo juiz Sérgio Moro a nove anos e seis meses de prisão.
As maiores caravanas saíram do interior do Rio Grande do Sul e dos estados de Santa Catarina e Paraná. Lula não estará presente no julgamento, mas deve participar de ato marcado para esta terça-feira (23) na capital gaúcha.
Os apoiadores de Lula podem escolher se hospedar em um acampamento montado no Anfiteatro Pôr do Sol, próximo ao tribunal, no bairro Praia de Belas, ou em uma rede envolvendo hotéis com desconto e hospedagem solidária. As informações estão disponíveis no site Com Lula em POA.
Os ônibus têm chegado desde domingo à capital gaúcha, organizados pela CUT (Central Única dos Trabalhadores) e pela Frente Brasil Popular. A estimativa do presidente da CUT no Rio Grande do Sul, Claudir Nespolo, é de que cerca de 30 mil pessoas desembarquem na cidade, em 225 caravanas. Nespolo espera, ainda, que ao menos 50 mil participem das atividades programadas.
"Não é todo dia que há uma condenação sem provas de alguém que pode ser a esperança da classe trabalhadora. Não é à toa que a CUT está participando: Lula pode interromper retrocessos como a reforma da Previdência", defende o sindicalista, para quem a condenação do ex-presidente visa a interromper sua candidatura à Presidência.
Da terra de Sérgio Moro são aguardados 30 ônibus lotados, com em média 1,3 mil pessoas, conforme cálculo da presidente da CUT no Paraná, Regina Cruz. A sindicalista afirma que também há quem vá de carro ou avião.
Cruz reconhece existir o estigma local de "República de Curitiba", termo cunhado por Lula em conversa por telefone com a então presidente Dilma Rousseff, vazada por Sérgio Moro. Mas ela prefere chamar a cidade de "República da Resistência". "É a terra do Moro, mas também tem muita resistência. Não é por acaso que, no dia 10 de maio (dia do depoimento em primeira instância de Lula), colocamos 100 mil pessoas na rua para prestigiar o ex-presidente", relembra.
A presidente da CUT-PR considera que, se a Justiça for honesta, o ex-presidente será inocentado. "A própria juíza acabou de dizer que o apartamento é da OAS e nunca foi do Lula", argumenta, referindo-se à decisão da magistrada Luciana Corrêa Tôrres, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que autorizou em dezembro a penhora do tríplex 164-A, do Condomínio Solaris, no Guarujá (SP), para pagamento de uma dívida da empreiteira OAS.
Moro concluiu, em sua decisão, que o imóvel foi dado ao petista pela construtora, como propina. Na opinião da sindicalista, a alegação de culpa de Lula no caso do tríplex é um "jogo de mídia e de política para tirar dele o direito de ser candidato".
É aguardada para esta segunda-feira (22) a chegada de três mil integrantes da Via Campesina, oriundos de diversas cidades do interior do Rio Grande do Sul. Todos se estabelecerão no acampamento do Anfiteatro Pôr do Sul, espaço aberto, à beira do lago Guaíba, a cerca de 700 metros da sede do TRF4.
"O sentimento da nossa militância é de que não se trata do julgamento do Lula, mas sim do povo. Todo mundo está sofrendo as consequências do golpe de Estado que ocorre desde o impeachment da presidente Dilma, seja ao retirarem os direitos dos trabalhadores, seja nas políticas pública que estão sendo construídas", opina o dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Rio Grande do Sul, Cedenir de Oliveira.
Oliveira acredita que a única maneira de o Judiciário não ficar desmoralizado é inocentando o petista. "Moro já se desmoralizou, mas o TRF-4 tem a oportunidade de fazer que a Justiça continue neste país. Se mantiverem a condenação, criarão um impasse, pois não cumprirão um papel jurídico, e sim político, já que não há provas da culpa de Lula", diz. De acordo com o ativista, esse impasse poderia gerar "uma crise muito grave no Brasil".
Carioca faz greve de fome
© Isabella Sander/Especial para o HuffPost Brasil
Esquálido e frágil, o carioca Richard Faulhaber, de 62 anos, pouco se levanta da cadeira de praia instalada em frente à Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. Esse tem sido o local onde fica quase o dia inteiro, desde o dia 10 de janeiro, há pouco menos de duas semanas, quando iniciou uma greve de fome. Segundo o fiscal de rendas aposentado, a decisão de parar de comer foi tomada há um mês, como forma pacífica de manifestar seu apoio ao ex-presidente Lula.
"Esta é uma declaração e um testemunho de amor, solidariedade e luta pelo nosso povo mais esquecido e marginalizado. É uma luta pelo direito da sociedade de ter moradia, comida, e em defesa do maior guerreiro, defensor desse povo", ressalta Faulhaber.
Para se manter vivo, o carioca conta com a ajuda da esposa, Márcia Alves Vilella, de 57 anos, que não está fazendo greve de fome. "Alguém tem que estar forte para ajudar se ele cair", explica ela. Durante a entrevista, Márcia se incumbiu de lembrar ao marido que precisava tomar água, o único alimento que está ingerindo, além de soro. Ele pediu que a entrevista ocorresse de manhã, pois à tarde o fiscal de rendas tem pouca energia para falar, em função da inanição.
Faulhaber reconhece que o ideal seria permanecer 24 horas por dia em local público, para provar que não está comendo nada. Porém, não conseguiu adesão de outros militantes que garantissem o plano com segurança.
"Fizemos há um mês a proposta ao MST de fazer uma greve de fome, porque precisaríamos de uma logística mínima de segurança. Infelizmente, não conseguimos, porque todos estavam ocupados com a organização das caravanas e dos protestos", lamenta. Sem estrutura para permanecer na rua à noite, a dupla se hospeda em um hotel e chega de manhã cedo ao Congresso gaúcho.
Para o carioca, o povo é "profundamente manipulado por essa mídia cartelizada" e, por isso, as pessoas acreditam na culpa de Lula. "Para a mídia manter o domínio, é fundamental deixar a população anestesiada, achando que todo político é ladrão e ficando totalmente sem esperança. É triste ver essa hipnose", comenta. Faulhaber admite que a greve de um homem só não significa quase nada, mas espera impactar de alguma maneira as pessoas, ao manifestar o ato de sacrifício.
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