Presos se rebelam e ateiam fogo em objetos na Delegacia de Maranguape

por Levi de Freitas - Repórter

Internos da Delegacia Metropolitana de Maranguape foram transferidos após princípio de motim que deixou o local em chamas; durante o trabalho policial de resgate, eles ficaram recolhidos em uma sala ( Fotos: Fernanda Siebra )
No pátio, do lado de fora da Delegacia, as motocicletas que haviam sido apreendidas pela Polícia ficaram destruídas pelas chamas
A Justiça proibiu, pelos próximos quatro meses, o ingresso de presas provisórias no Instituto Penal Feminino Auri Moura Costa, em Fortaleza ( Foto: Agência Diário )

O juiz corregedor de presídios da Comarca de Fortaleza, Luiz Bessa Neto, determinou a interdição parcial do Instituto Penal Feminino (IPF) Desembargadora Auri Moura Costa. O equipamento não poderá receber internas provisórias em período mínimo de quatro meses, que poderá ser prorrogado. A medida, segundo o magistrado, é para desafogar a unidade, superlotada especialmente por mulheres que ainda nem sequer foram julgadas. A situação, porém, torna-se caótica para as delegacias de Polícia Civil da Capital e Região Metropolitana, por sua vez também abarrotadas de presos em situação sub-humana.
Ontem, os reclusos na unidade de Maranguape puseram fogo em objetos e protagonizaram o segundo momento de tensão em três dias. No fim de semana, outras delegacias também superlotadas registraram princípios de motim e tentativas de fuga. Conforme a Polícia Civil, 805 pessoas estão reclusas nos xadrezes das delegacias da Região Metropolitana de Fortaleza. A capacidade é para 400.
A decisão judicial foi publicada no Diário da Justiça da última sexta-feira (18). Conforme o texto, no prazo de quatro meses, o IPF não poderá acolher presas provisórias. A proibição não vale para mulheres condenadas em regime fechado.
O magistrado considerou as denúncias feitas pela Defensoria Pública do Estado, indicando irregularidades na gestão de encarceramento, como excesso prisional na ordem de 100%; encarceramento recente de presas provisórias junto a presas condenadas (contrariando a finalidade do IPF de acolher presas condenadas); e a necessidade de cuidar de forma mais adequada das gestantes encarceradas no local.
"As internas em estado maternal deverão ser separadas das demais, sejam provisórias ou condenadas, e quando possível, observado o limite de vagas da creche, serem ali internadas a partir do sexto mês de gestação", determinou o magistrado.
Limite
Ainda conforme o juiz, o Instituto "alcançou o limite de mais de 500% de internas provisórias em face das condenadas em regime fechado e que essa realidade agride as recomendações das Regras Mínimas para o Homem Encarcerado da Organização das Nações Unidas (ONU)".
As mulheres não podem ser acomodadas em celas junto dos homens. Diante da superlotação das delegacias - o 34º DP (Centro), por exemplo, com capacidade para 14, abriga 52 presos - há o agravante da situação, uma vez que não há espaço para ninguém. Isto pois o mesmo juiz corregedor dos presídios restabeleceu portaria em que apenas entra um preso no Sistema Carcerário após a saída de dois. Enquanto isso, os presos permanecem aguardando nas delegacias.
À reportagem, Bessa Neto afirmou que cabe ao Poder Executivo encontrar uma solução para o problema. "Estamos no aguardo, nos posicionamos enquanto Poder Judiciário. Nossa intervenção aconteceu, e o Executivo deverá buscar mecanismos adequados de ajustes para não prejudicar o sistema de Polícia Judiciária e a atuação do Judiciário no processamento de novos casos".
O diretor do Departamento de Polícia Metropolitana (DPM), delegado Jairo Façanha Pequeno, criticou a postura adotada pelo magistrado. "Não temos nem onde colocar os homens, onde vamos colocar as mulheres? A situação já estava insustentável, e agora vai ficar pior ainda. A gente apela para o bom senso. É fácil interditar, mas qual a solução? Com as delegacias superlotadas, há risco diário de motim, rebelião. Os presos estão revoltados, tentam fugir. Uma medida dessa só prejudica a população", afirmou.
O Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), expediu uma recomendação para que os presos oriundos da audiência de custódia não sejam recebidos por uma Delegacia da Capital, mas sim imediatamente encaminhados, devidamente escoltados, ao Centro de Privação Provisória de Liberdade ou Centro de Triagem. Após a realização da audiência, os presos estão superlotando o 26º DP, localizado no bairro Edson Queiroz.
Sobre a interdição, a Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado (Sejus) disse acreditar "que o projeto Audiência de Custódia deverá, a médio prazo, reduzir a população carcerária".
Incêndio
Na manhã de ontem, presos se rebelaram e atearam fogo na Delegacia Metropolitana de Maranguape. Segundo a PM, o motim teve início por volta das 8h na tentativa de fugir. Os presos foram retirados da cela e ficaram abrigados em uma sala.
A Polícia realizou a contagem ainda durante a manhã e constatou que um homem conseguiu escapar. No momento da rebelião, 34 presos estavam dentro do xadrez. Esta foi a terceira movimentação registrada na Delegacia de Maranguape neste mês.
No último sábado (19), os inspetores impediram a fuga dos presos que tentavam serrar as grades do xadrez. Já no último dia 10, os detentos ameaçaram greve de fome em protesto contra a superlotação. A Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado (Sejus) informou que transferiu os presos para cadeias públicas da RMF. O MPCE informou que ingressou com uma Ação Civil Pública com liminar para a interdição e reforma da Delegacia e Cadeia Pública de Maranguape.