Ex-diretor da Petrobras: cerveró lucra vendendo imóvel comprado com dinheiro sujo

Cerveró lucra 1 milhão vendendo imóvel comprado com dinheiro sujo

Desde a sua gênese em 2014, a operação Lava-Jato estabeleceu uma meta: recuperar 5,5 bilhões de reais surrupiados dos cofres da Petrobras por meio de multas e devoluções dos próprios operadores do propinoduto. Há duas semanas, mais uma contribuição foi dada a este processo, por assim dizer, civilizatório. Diretor internacional da empresa entre 2003 e 2008, cargo em que comandou um esquema gigantesco de propina, o notório Nestor Cerveró pagou 6 milhões de reais como parte do ressarcimento previsto no acordo de delação premiada homologado pelo Supremo Tribunal Federal. Ficou no ar a dúvida: de onde Cerveró, condenado por corrupção e lavagem de dinheiro e há três anos sem trabalhar, tirou recursos para pagar a multa? Resposta: ele vendeu por 7 milhões de reais um apartamento comprado assumidamente com dinheiro sujo. Resumindo, ainda saiu do negócio com 1 milhão no bolso.



    A proeza de lucrar com a corrupção pregressa aconteceu no início deste mês e é fruto do acordo de delação. Em circunstâncias normais, um bem adquirido com dinheiro ilícito seria confiscado, mas Cerveró conseguiu que o imóvel continuasse sendo propriedade sua e, assim, pode concluir o negócio. O apartamento em Ipanema, Zona Sul do Rio de Janeiro, onde ele morou com a mulher por cinco anos, foi justamente o alicerce da acusação pela qual o juiz Sérgio Moro o condenou a cinco anos de cadeia (hoje cumpridos em prisão domiciliar). Em 2015, VEJA revelou que o dúplex de 300 metros quadrados estava em nome de uma offshore uruguaia, a Jolmey Sociedad Anonima. A empresa criada em 2008 se dizia interessada no mercado imobiliário carioca, mas durante toda a sua existência comprou apenas um único bem no Brasil. Adivinhe qual? O apartamento de Ipanema. VEJA revelou ainda emails trocados entre Cerveró e advogados no Uruguai que tratavam da criação da Jolmey e da compra do imóvel. Depois de muito negar, o ex-executivo enfim assumiu que era dono da offshore e do dúplex.

    Em seu acordo de delação premiada, o ex-diretor da Petrobras comprometeu-se a devolver um total de 17 milhões de reais aos cofres públicos em dez etapas. Parte deste dinheiro foi repatriada de contas no exterior; a outra virá da venda de imóveis da família Cerveró. O ex-diretor está negociando mais dois apartamentos (sem ligação com propina) para quitar as parcelas finais do ressarcimento – e, quem sabe, lucrar mais algum. Procurada, a defesa de Cerveró não quis confirmar o nome do comprador do apartamento de Ipanema e não informou o preço dos demais imóveis.
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    Cerveró atualmente vive em uma casa em Itaipava, na região serrana do Rio, de onde só pode sair para algum tratamento médico ou para audiências na justiça. A tornozeleira eletrônica que usa deverá ser removida no ano que vem. Em suas delações, citou políticos como Lula, FHC, Dilma Rousseff, Eduardo Cunha, Renan Calheiros e Fernando Collor e contou muitas histórias, mas apresentou poucas provas objetivas. VEJA apurou que pelo menos dez denúncias dele acabaram não dando em nada.

    Advogados envolvidos em outras delações justificam a existência de acordos do tipo do que beneficiou Cerveró. “É natural que o colaborador obtenha benefícios, tanto na redução de penas quanto em arranjos financeiros. Não fosse assim, não haveria interesse em colaborar”, argumenta Fernanda Tórtima, que já advogou para o ex-deputado Eduardo Cunha e para o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado. Mas a instituição do troca-troca é criticada nos meios jurídicos quando, como no caso de Cerveró, as benesses parecem extrapolar o razoável. “Há delatores lucrando com o ilícito enquanto os lesados não recebem a indenização necessária”, resume Érica Gorga, especialista em mercado de capitais e fraudes financeiras. Informações colhidas através do site VEJA